O controle da inflação tem um papel central nas decisões políticas e econômicas do país e o atual governo enfrenta o desafio de equilibrar o crescimento dos gastos obrigatórios com a necessidade de ajustes fiscais. Essa é uma das sinalizações apresentadas pela economista Zeina Latif durante a palestra inaugural do 99º Encontro Nacional da Indústria da Construção (ENIC) | Política & Estratégia, na manhã da terça-feira (26/11). Realizado pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) no salão de eventos do edifício-sede da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em Brasília.
“A subida dos juros pelo Banco Central, em um cenário de inflação mundial mais baixa, gera preocupações, especialmente quando o Brasil segue uma tendência contrária à de outros países”, afirmou. Ao analisar as perspectivas de crescimento econômico do Brasil, Zeina destacou o crescimento positivo nos últimos anos. No entanto, ela questionou até que ponto esse ritmo pode ser mantido no curto prazo, considerando os desafios estruturais da economia, como a necessidade de o Banco Central voltar a subir os juros — algo que poderia ter sido evitado com uma política fiscal mais cuidadosa.
O 99º ENIC é promovido pela CBIC, em correalização com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Serviço Social da Indústria (Sesi), com apoio institucional da Confederação Nacional da Indústria (CNI). O evento conta com os patrocínios do Sienge, do Sistema Confea/Crea/Mútua, da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), da Caixa Econômica Federal (CEF) e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
Em sua palestra, a economista destacou que o Brasil atravessa um ciclo econômico volátil, com recessões e desacelerações cada vez mais frequentes, muitas vezes desconectadas das tendências globais. “Nos anos 80, o Brasil era altamente vulnerável a choques externos, com uma economia superendividada, reservas internacionais limitadas e uma base exportadora concentrada em poucos produtos”, pontuou. “Isso resultava em grande volatilidade e desvalorizações constantes. No entanto, ao longo do tempo, políticas públicas eficazes e o dinamismo do setor privado permitiram avanços significativos, como a superação da insegurança alimentar e a melhoria das contas externas, o que levou o país a alcançar estabilidade desde 2006. Essas conquistas foram fundamentais para reduzir a volatilidade econômica observada nas décadas anteriores”, acrescentou a economista.
Retomada do emprego
A economista também mencionou o contexto de pleno emprego no Brasil, embora com disparidades, como no setor da construção, onde a escassez de mão de obra qualificada é um problema crescente. “Isso tem gerado ajustes salariais elevados, chegando a quase 10% ao ano, acima da meta de inflação de 3%, criando um risco inflacionário considerável”.
Segundo ela, a construção civil é um setor sensível à taxa de juros, mas outros segmentos, como o consumo e o mercado de trabalho, tendem a ser menos impactados. A geração de postos de trabalho, por exemplo, não é muito afetada pelos ciclos de juros. O Brasil tem observado a geração de vagas com carteira assinada e o crescimento do micro empreendedorismo, o que representa um contraste com o passado. Embora possa haver uma desaceleração na criação de vagas, não se espera um ciclo de desemprego significativo, sinalizou a economista.
Na sua avaliação, os setores mais afetados pelas variações de juros são aqueles ligados a investimento, especialmente a construção, que pode enfrentar maiores desafios. No entanto, muitos contratos já firmados podem ajudar a reduzir o impacto imediato nesse setor.
A especialista destaca que a agenda de contenção de gastos não deve ser responsabilidade exclusiva do governo, mas envolver o apoio da sociedade como um todo. “As reformas são necessárias e independem de quem ocupa o cargo político, mas o apoio popular é essencial para o sucesso dessas decisões difíceis”, comentou.
Inovação e sustentabilidade
A economista contextualizou que o Brasil enfrenta o desafio de elaborar uma estratégia de ajuste fiscal, sem necessariamente buscar estabilizar a dívida pública, que está em torno de 80% do PIB. Ela destaca que é importante definir diretrizes claras e demonstrar que há um plano de longo prazo. Zeina também enfatizou que, apesar de ser um governo de esquerda, o Brasil está tratando temas polêmicos, como a reforma fiscal, de forma serena. Isso tem um valor simbólico significativo, especialmente considerando que poucos países emergentes adotam reformas econômicas com essa abordagem.
No painel, Zeina abordou os impactos diretos da reforma tributária, atualmente em tramitação no Senado Federal, sobre o setor da construção. Esse tema, que preocupa o empresário da construção, tem sido acompanhado pela CBIC. Zeina mencionou a importância do momento para que a indústria da construção adote estratégias de industrialização, como a implementação de tecnologias e processos que aumentem a produtividade.
A industrialização do setor, disse, é vista como uma solução para reduzir custos, aumentar a eficiência e garantir a sustentabilidade das obras. A economista fez uma análise detalhada das tendências que estão moldando o futuro da economia, com foco em inovação, sustentabilidade e o impacto das novas tecnologias. Zeina enfatizou a importância de estar preparado para aproveitar as oportunidades que surgem nesse cenário. Um ponto importante abordado foi a necessidade de atrair talentos, incluindo pessoas que estejam trabalhando fora do país, para o desenvolvimento de tecnologias adequadas à realidade brasileira.
Para ilustrar sua visão, ela citou a Embrapa como exemplo bem-sucedido do como a tecnologia pode ser adaptada para a produção de alimentos e destacou que, no futuro, soluções de inteligência artificial também desempenharão um papel crucial na superação das lacunas existentes. Zeina provocou o público a refletir sobre como a capacidade de se preparar e adaptar às novas oportunidades será decisiva para o sucesso econômico no futuro.
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